Transformação Digital

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Por Paulo Emediato

Por que a tal Transformação Digital não vai salvar o seu negócio?

“Quero mudança, pertencer ao novo, se possível na velocidade de um click. Não importa se o que os outros fazem dá certo ou não.

Estou perdido, não consigo reconhecer, mostrar fraqueza, dizer “eu não sei”. Preciso ter certeza! Todo mundo indo naquela direção, vem, vamos, parece que funciona e isso já justifica o investimento.”

Era da abundância, organizações exponenciais, tecnologias disruptivas, transformação digital, startups, design thinking, sprint, corporate ventures, hackathons, millenials… soa familiar? Bem vindo ao famoso buzzword BINGO da inovação!

Buscamos os caminhos mais curtos. Adoramos receitas infalíveis, não resistimos ao comportamento de manada e na medida em que cada uma palavrinha dessas ganha força, maior é a pressão sobre os executivos.

-“Como assim? Você ainda não fez um hackathon?”

– “Ainda não encheu suas reuniões de canvas e post-its?”

-“Não visitou o zoológico de startups? Você precisa se relacionar com as startups, mas, cuidado, não alimente os empreendedores!”

– “Cadê sua área de Digital Transformation?”

– “Temos um projeto com o IBM Watson. Não temos a menor ideia do que vamos fazer com isso, mas temos.”

Se ainda não fala sobre Transformação Digital, perdeu o bonde, já era. E o efeito dessa onda é previsível: pressionados a inovar, sofrendo bullying do mercado, sem a menor ideia do que fazer e com muita pressa, o que escolhem os executivos?

  • Apostam as fichas em tecnologia. Compram coisas, produtos digitais, plataformas, sistemas. Sempre uma bela forma de extravasar ansiedade e insegurança.
  • Acreditam que “edutainment” e palestras funcionam como conhecimento. “Venha, faça uma dinâmica, pregue uns post-its coloridos e ensine nossos líderes a inovar. Tem que ser muito inspirador, chacoalhar a turma e engraçado ao mesmo tempo. Tudo em 30 minutinhos, afinal, ninguém tempo pra essas coisas. ”
  • Criam cargos de especialista em Transformação Digital, Gerentes de Inovação e esperam que a solução venha dessas pessoas. Não virá. Na real, essas figuras acabam isoladas numa grande enrascada. Se a mudança não for um compromisso de todos, muito pouco acontece.
  • Burocratizam o processo, através de estruturas, só pra justificar ao mercado. Se o papo começa com comitês, editais, conselhos, programas, sabemos bem onde vai parar.
  • Buscam novas respostas em velhas fontes, submetidas a uma boa sessão de “botox marqueteiro”. Trocam os nomes, as identidades, as marcas e repetem-se as mesmas receitas.
  • Cobram e medem os resultados do mesmo jeito. Pode tudo, desde que venda mais, aumente a rentabilidade e reduza os custos imediatamente. Cliente? O cliente mais importante é o acionista!
  • Esquecem que cultura só acontece com e através das pessoas. Inovação sem cultura não se sustenta. É fundamental quebrar o ciclo de humanização das máquinas e mecanização das pessoas. Robôs cada vez mais humanos são incríveis, mas o contrário é um desastre!

“Culture eats strategy for breakfast” P. Drucker – A tecnologia não existe como fim em si mesma. Boa parte do seu investimento será completamente inútil se orientado sob o mesmo modelo mental. Sem colocar as pessoas no centro da estratégia, apenas ampliamos o descolamento entre uma organização repleta de recursos, gadgets e jargões, porém regida por olhares e mentes de “retrovisor”, viciadas no caminho passado.

Transformação digital está longe de ser uma discussão de base tecnológica. Inovar é ressignificar as relações entre as pessoas, com o mercado, entre áreas para propor novas experiências de troca de valor. A tecnologia é um ótimo meio para facilitar isso, mas nunca o centro da estratégia.

Você conhece alguém que se tornou o melhor guitarrista do mundo porque comprou a melhor guitarra? A metáfora é meio banal, mas é isso mesmo. Mudar uma cultura é um exercício de longo prazo que exige comprometimento para desenvolver novas habilidades, colaborar transversalmente, estabelecer outro modelo mental entre clientes internos e externos, todos os dias. Gosto de chamar isso de fisioterapia corporativa.

Mudar, construir hábitos, fazer diferente, leva tempo, requer determinação e dói. Dói e dá medo, de verdade! Se alguém quer te convencer de que isso acontece de uma hora para outra, comprando soluções e atualizando a linguagem, tenho uma péssima notícia…

Estou longe de saber o caminho certo. Mas posso garantir o que vejo em inúmeras organizações com as quais me conecto. O mais impressionante é que aquelas que investem numa virada cultural de fato – em longo prazo, bancando uma eventual perda de lucratividade imediata, a fim de construir uma relação mais saudável em toda a cadeia – são recompensadas por sua paciência.

Esse investimento em comportamento, empatia e, só então, em inovação tecnológica gera impactos tangíveis e intangíveis cada vez mais relevantes. No fim das contas, como em tudo na vida, existem atalhos, sempre com um custo muitas vezes ignorado. Não adianta anabolizar a inovação e esquecer que os efeitos colaterais em longo prazo serão indigestos, difíceis de reverter. Transformação digital não salva negócios. Pessoas salvam negócios, sobretudo quando concentram seus esforços em impactar e gerar mais valor para as outras pessoas. Só assim a tecnologia faz sentido.

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Paulo Emediato

Managing partner na DesignThinkers Group Brasil, já facilitou a cocriação de estratégias e soluções em organizações como Globo, BrMalls, Hermes Pardini, Localiza, Gerdau, MRV, Anima, Embraco, Hotmart, Sebrae, entre outras. Idealizou e cofundou o MESHA - um laboratório livre de conexão e aprendizado. Tem 15 anos de experiência corporativa na gestão de marketing, comunicação e inovação em organizações de diferentes setores como Fundep, CNI, Governo de Minas, Oi e TokStok. Passou por formação executiva na Stanford School Of Business, é especializado em gestão na Fundação Dom Cabral e graduado em comunicação pela PUC Minas.
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